Memória - Adeus! A Astronomia brasileira está de luto! - Por Nelson Travnik.
Memória - Adeus
Astronomia brasileira está de luto,
MORRE RONALDO MOURÃO, MAIOR NOME DA ASTRONOMIA - por Nelson Travnik *
A comunidade astronômica brasileira e todos aqueles que cultuam a ciência do céu, foi abalada no dia 25 de junho último, com o falecimento nesse dia às 20:50, do celebrado astrônomo Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, vitima de uma pneumonia seguida de um derrame. Carioca nascido em 25 de maio de 1935, contava então com 79 anos. Seus restos mortais repousam no Cemitério São Francisco Xavier, no Caju. Ele não foi enterrado; não foi sepultado. Ele foi plantado para que dele nasçam novos discípulos de Urânia, a Musa da Astronomia. Segundo seu filho Marcelo, ele estava absorvido na atualização da sua grandiosa obra: “Dicionário Enciclopédico de Astronomia e Astronáutica” e já havia contraído e curado de uma primeira pneumonia no inicio de abril. Duas vezes fui visitá-lo em sua casa no campus do Observatório Nacional.
A última vez já encontrei-o bastante debilitado acometido pelo mal de Parkinson. Reverenciando sua memória e a grande amizade que sempre nos uniu, segue abaixo o artigo escrito sobre essa última visita.
REENCONTRO COM RONALDO MOURÃO
“O FLAMMARION BRASILEIRO”
Quinta-feira, 16 de janeiro, 2014, 11h00. Depois de três anos, uma nova oportunidade de reencontra-lo em sua residência no ‘campus’ do Observatório Nacional, CNPq, MCT. Foi uma excelente ocasião de conversarmos sobre os temas mais atuais da astronomia, os trabalhos e os progressos das instituições brasileiras e os novos planetários e observatórios que estão sendo construídos tanto oficiais como particulares. Nos detivemos sobre as observações dos aficionados que mercê novas tecnologias à disposição, realizam trabalhos e descobertas de altíssimo nível. Conversamos muito lembrando os velhos tempos no Observatório Nacional, ele ainda muito jovem como eu, cercados por outros astrônomos, a maioria já falecidos e de grata lembrança. Tempus Fugit, e como! Na ocasião me mostrou dois livros seus publicados no Japão e adiantou que outro já esta no prelo nos Estados Unidos.
Ao longo das 85 obras publicadas, mais de 600 artigos em revistas, periódicos e jornais, o destaque fica para o seu “Dicionário Enciclopédico de Astronomia e Astronáutica”, obra exaustiva, fruto de muitos anos de pesquisa. Já em 2ª edição pela Editora Nova Fronteira, segundo ele, está a caminho uma 3ª edição. É impossível um astrônomo ou interessado não possuir esta obra em sua estante. É no gênero, a mais completa das Américas e recebeu elogios de algumas das maiores celebridades da astronomia, ciência espacial e historiadores.
A maioria das pessoas geralmente costumam aliar Mourão somente a literatura astronômica e não conhecem suas contribuições científicas. São inúmeras. Elas estão relatadas na minha série “Personagens da nossa Astronomia”. Entre elas estão a descoberta de 72 novos asteroides feitas em seu estágio no Observatório La Silla, Chile. Seu colega H. Debehogne homenageou Mourão com seu nome no asteroide 2590 descoberto por ele em 22 de maio de 1980. Outra pesquisa que reputo importante foi em 1969 quando constatou a existência de um companheiro invisível na estrela dupla Aitken 14, confirmada pelo astrônomo Baize do Observatório de Paris. Na ocasião Mourão levantou a hipótese de que poderia ser um novo sistema solar e, sendo assim, isso adentra na área dos exoplanetas, razão pela qual deveria ser mencionado. Essa descoberta é, quiçá, pioneira.
Minha identidade com Mourão é muito grande, tanto pela atenção e conhecimentos a mim transmitidos como talvez termos a mesma idade e sermos do mesmo Estado do Rio de Janeiro. Ele demonstrou sua atenção e valorização com os astrônomos amadores ao criar com um grupo, o “Clube de Astronomia do Rio de Janeiro’, CARJ, fundado em 30 de junho de 1976. É o seu Presidente de Honra. Por morar próximo ao Rio, por quase 22 anos frequentei o Observatório Nacional como também o Observatório do Valongo, UFRJ. Essas duas Instituições foram a minha escola.
Na despedida Mourão me ofereceu o livro de sua autoria “Astronomia & Budismo – Uma Jornada rumo ao Distante Universo” que gira sobre uma conversa dele com o famoso espiritualista Daisaku Ikeda. É sempre oportuno, salutar e mesmo natural uma incursão nesta área como aliás o fizeram físicos e astrônomos famosos.
O “Flammarion Brasileiro”como eu o chamo, é e ainda será por muitas gerações, o astrônomo que mais despertou mentalidades voltadas a astronomia no Brasil. Mourão é uma referência e um orgulho para nosso País.
* Nelson Travnik, diretor do Observatório Astronômico de Piracicaba, SP, e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França.