Ora direis ouvir estrelas em Campinas? - por Nelson Travnik
ASTRONOMIA - Ora direis ouvir estrelas em Campinas?
Por Nelson Travnik*
Que a contemplação do céu encanta e fascina, é sabido desde o alvorecer da humanidade. Os desenhos dos astros em algumas cavernas pré-históricas, são testemunho desses tempos longínquos. Isso proporcionou mais tarde conhecimentos imprescindíveis a elaboração dos calendários e as estações do ano que passaram a reger o cotidiano das pessoas. Da observação visual aos proporcionados pela construção de instrumentos ópticos aliados as modernas tecnologias de ampliação e digitalização de imagens, os conhecimentos sobre o universo deram um salto gigantesco. Isso nos levou a bilhões de galáxias com trilhões de estrelas e planetas na conclusão assustadora de que nosso habitat não passa de um grão de poeira ao sabor dos ventos do deserto.
Imagem: A grande antena do Radiotelescópio do MAAS
Mas não somente perscrutar o universo através de meios ópticos em terra e no espaço através das sondas e telescópios espaciais, a introdução da radioastronomia desenvolvida a partir de 1932 por Karl Guthe Jansky (1905-1950), analisando um ruído análogo a uma fraca estática de rádio vindo da constelação do Sagitário posteriormente identificada por Sagitarius A. Isso permitiu estudar os fenômenos das ondas eletromagnéticas freqüência radio permitindo detectar a chamada radiação cósmica de fundo primordial observada hoje em todo o céu e que teria dado origem ao Big Bang.
Enquanto telescópios ópticos formam imagens a partir da luz visível, os radiotelescópios podem determinar as características de um corpo celeste a partir das ondas de rádio, raios X, e luz infravermelha que estão fora do intervalo visível. Ele funciona porque os corpos celestes emitem radiação eletromagnética de forma natural. Os radiotelescópios são também indicados na procura de vida extraterrestre e no acompanhamento das sondas espaciais. A descoberta da radioastronomia é de tamanha importância que trabalhos nessa área já foram quatro vezes premiados com o Prêmio Nobel.
Os radiotelescópios podem ser móveis, imóveis e em cadeia. O maior móvel é o de Effelsberg na Alemanha com antena de 100 metros de diâmetro. O maior imóvel é o que fica na região montanhosa de Guizhan na China com antena de 500 metros de diâmetro. O em cadeia atualmente o ‘maior ouvido do universo’, é o ALMA, “Atacama Large Milimeter Array”, localizado a 5000 metros de altitude na Zona de Chajmantor, Atacama, Chile. Com 66 antenas a um custo de 1,4 bilhão de dólares ele pode registrar imagens inéditas de nascimento de estrelas, galáxias e estudar e descobrir moléculas que se formam no espaço entre as estrelas em ondas milimétricas e sub-milimétricas que pouquíssimos telescópios conseguem.
No Brasil, os primeiros passos da radioastronomia foram dados pelo francês Pierre Kaufmann (1938-2018) pioneiro no ensino e pesquisa. É dele o primeiro radiotelescópio construído em 1959 no Ibirapuera ao lado do Planetário. Em 1970 foi o responsável pelo projeto e construção do Radiotelescópio de Itapetininga, Atibaia/SP. Com uma antena de 14 m de diâmetro operando em ondas milimétricas, ele é ainda o maior do Brasil e é operado pelo INPE.
A radioastronomia é também campo fértil nas áreas do ensino e divulgação. Nesse sentido Campinas pode se orgulhar de possuir um radiotelescópio pedagógico único no País com antena de 12 metros de diâmetro. Ele é parte do Museu Aberto de Astronomia, MAAS, situado no Pico das Cabras em frente ao Observatório Municipal, distrito de Joaquim Egídio. Ele está sintonizado na janela da emissão do hidrogênio em 1420 MHz. Os ‘sons do universo’ vai para um computador e é projetado em uma tela onde os visitantes ouvem as explicações sobre o que está sendo mostrado e a radioastronomia. O MAAS está aberto à visitação aos sábados, domingos e feriados a partir das 08:00. Atividades acontecem a partir da 14:00.
Visitas escolares e de grupos interessados precisam ser previamente agendados no telef. 19-3298.6246 e maiores informações são encontradas em: informações@picodascabras.com.br.
*Nelson Travnik é astrônomo em Campinas, diretor do Observatório Astronômico de Piracicaba e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França.